Até o século XVII, a natureza e a cultura eram vistas de forma mais integrada. O Iluminismo e a Revolução Científica mudaram essa relação:
-
Natureza passou a ser entendida como um objeto autônomo, regido por leis universais, passível de ser estudado e dominado pela razão científica.
-
Cultura passou a ser vista como o conjunto das criações humanas — artes, técnicas, instituições, religião, linguagem — que se opunham ao mundo natural.
No século XVIII, especialmente com filósofos como Rousseau, consolidou-se a ideia de que a cultura (civilização) “afasta” o homem de sua condição natural. A natureza era associada ao estado original e puro, enquanto a cultura representava progresso, mas também desigualdades. Essa oposição marcou profundamente a filosofia, a ciência e a política.
-
Hegel: via a História como a realização progressiva da Liberdade do Espírito. A cultura, nesse processo, seria a manifestação do espírito humano nas artes, religiões, filosofia e instituições. Ou seja, a cultura é movida por ideias e pelo desenvolvimento do Espírito Absoluto.
-
Marx: rejeitou essa visão idealista. Para ele, a História é resultado das condições materiais de produção. A cultura não é fruto do Espírito, mas das relações econômicas e sociais. Assim, a consciência e a cultura derivam da base material (infraestrutura), e não o contrário.
A discordância, portanto, está no fundamento da História: para Hegel, ela é espiritual/ideal; para Marx, é material/econômica.
Na Antropologia, sobretudo a partir do século XIX, cultura passou a ser vista como:
-
Um sistema simbólico que organiza práticas, crenças, valores e significados de um grupo humano.
-
Universal: todos os povos têm cultura, embora sejam diferentes em forma e conteúdo.
-
Relativista: não há culturas superiores ou inferiores; todas devem ser entendidas dentro de seus próprios contextos (princípio do relativismo cultural).
Autores como Franz Boas e Clifford Geertz reforçaram a ideia de que a cultura é uma “teia de significados” construída coletivamente e compartilhada.
No senso comum, frequentemente se confunde “cultura” com erudição ou acúmulo de conhecimento escolar/livresco. Isso gera preconceitos, como:
-
Achar que apenas quem tem educação formal ou domina saberes ocidentais é “culto”.
-
Considerar povos indígenas, comunidades tradicionais ou camadas populares como “incultos”, ignorando suas formas próprias e riquíssimas de cultura.
-
Valorizar apenas a chamada “alta cultura” (literatura clássica, música erudita, filosofia) em detrimento da cultura popular (festas, músicas, saberes tradicionais).
Esse preconceito reflete uma visão etnocêntrica, que hierarquiza culturas ao invés de reconhecê-las como expressões legítimas da experiência humana.
5. O senso comum pressupõe a existência de uma "natureza humana". Isso se sustenta? Por quê?No senso comum, fala-se em “natureza humana” como se existisse um conjunto fixo, imutável e universal de características (bondade, maldade, egoísmo, solidariedade, etc.).
-
Na filosofia e nas ciências humanas, essa ideia é questionada, porque o ser humano é profundamente moldado pelo contexto histórico, cultural e social.
-
O que chamamos de “natureza humana” muitas vezes é uma generalização ou projeção cultural, usada para justificar comportamentos ou instituições (ex.: “a guerra é natural”, “o homem é naturalmente competitivo”).
-
Assim, não existe um consenso absoluto sobre “natureza humana”; o que há são potencialidades biológicas, mas que só se realizam em contextos sociais e culturais específicos.
A palavra “natureza” é polissêmica. Dois sentidos importantes:
-
Natureza como totalidade do real físico – o conjunto de todos os fenômenos naturais: montanhas, mares, florestas, estrelas, seres vivos. Nesse sentido, a natureza é tudo aquilo que não é produzido pelo homem.
-
Natureza como essência – aquilo que define a identidade de um ser ou coisa. Por exemplo: “a natureza do fogo é queimar”, “a natureza do homem é racionalidade” (segundo Aristóteles). Nesse caso, “natureza” significa princípio constitutivo ou essência fundamental.
-
Sociedade latina (Roma antiga):
A palavra cultura vem de colere = cultivar. Inicialmente, significava o cultivo da terra (agricultura). Depois passou a significar também o cultivo do espírito (cultura animi em Cícero), ou seja, o cuidado com a formação intelectual e moral. -
Século XVIII (Iluminismo):
Cultura passou a designar o conjunto das realizações humanas em oposição à natureza. Ou seja, tudo o que o homem cria – artes, ciências, instituições – é cultura, diferente do que existe espontaneamente na natureza.
Na Antropologia, cultura é um conceito central e pode ser entendido de três formas principais:
-
Cultura como diferenciação – é o que distingue o ser humano dos outros animais. O homem não vive só da natureza: ele a transforma, simboliza e dá sentido a ela.
-
Cultura como diversidade – não existe apenas uma cultura universal; existem muitas culturas. Cada povo ou comunidade cria formas próprias de viver, pensar e expressar-se.
-
Cultura como totalidade simbólica – cultura não é só costumes externos (roupas, festas), mas também valores, crenças, linguagem e significados. É uma “teia de símbolos” que organiza a vida social (Clifford Geertz).

Nenhum comentário:
Postar um comentário